sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Software Livre,
Contra e a Favor ?




O Estado de S. Paulo, Colunas - SP - 14/02/2005 - por Marcelo Tas No Brasil, podemos nos queixar de tudo, menos da monotonia. Depois do futebol, da caipirinha e do carnaval… acredita-se que em breve vamos nos tornar o país do software livre!

Softwares são os programas que fazem o computador funcionar. Software livre, como o próprio nome sugere, é um tipo de programa que não é controlado por uma empresa ou pessoa. É colocado no mundo com os segredos abertos. Pode ser alterado com a mesma falta de cerimônia que um motor de Fusca é remendado seguidamente por brasileiros.

Taí: o Fusca pode ser o primeiro indício de que o brasileiro tem talento para software livre. Em qualquer esquina do País é possível encontrar um mecânico amador, uma espécie de hacker de automóvel tupiniquim, pronto para abrir o motor do bicho e fazê-lo funcionar. Nem que seja por algumas horas.

Mas programar computador é outra história. É coisa para nerds faixa-preta. São seres que encontram prazer em escrever, linha por linha, todos os passos que a máquina deve dar quando apertamos as suas teclas.

Os supernerds vivem num mundo paralelo. São surfistas de hard-disk, subindo e descendo ondas de zeros e uns. Numa entrevista para TV, perguntei a um deles se sobrava tempo para namorar. Respondeu com aquele sorriso tímido e nervoso de nerd que, para ele, programar computador era uma forma de sexo (!?). Ops, se for assim, parece que temos chance.

O entrevistado era Marcelo Tosatti, jovem curitibano que, aos 18 anos, se tornou o mantenedor mundial do Linux kernel 2.4. Traduzindo: o cara é uma espécie de principal guardião do núcleo principal (kernel significa caroço) do Linux, o software livre mais famoso do mundo. Trata-se de um sistema operacional de computador aperfeiçoado continuamente por uma multidão de nerds anônimos, que hoje já assusta o mega nerd Bill Gates.

Como você sabe, Gates fez sua fortuna vendendo um sistema operacional fechado, o Windows. Só ele atualiza e aperfeiçoa o programa. E cobra por isso.

O Brasil é o primeiro país do mundo a adotar software livre como política de governo. Uma tremenda ousadia do presidente Lula. Dois pontas-de-lança atuam nesse jogo pesado que cutuca cachorros-grandes da indústria. Na inspiração conceitual e animação cultural, está o ministro Gilberto Gil. Na linha de frente, chutando a canela dos beques adversários, o sociólogo Sérgio Amadeu, presidente do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), autarquia da Casa Civil da Presidência da República.

Nenhum dos dois é especialista no assunto. Estão longe de serem supernerds. Mas fazem barulho e conquistam a atenção de indivíduos e instituições importantes do mundo digital. Profetas do cyberespaço garantem: se o Brasil implementar o software livre em larga escala, a China vem junto. E boa parte do resto do mundo.

Entendeu agora por que Bill Gates tentou cavar uma reuniãozinha de última hora com Lula no recente Fórum Econômico Mundial, em Davos?

Esta coluna não é devota de nenhum evangelho digital, militância política ou estratégia corporativa. Por isso se encerra colocando duas minhocas na sua cabeça: uma a favor e outra contra o software livre.

Contra: o governo vai tratar o software livre com a doçura revolucionária de Che Guevara: endurecer sin perder la ternura jamás? Ou será que a tendência stalinista de alguns membros do PT vai fazer o software livre virar uma religião, um novo monopólio? Vão criar a Linuxbrás?

É uma sinuca de bico. A força do software livre está na interação e na liberdade criativa das comunidades. Não vai ser fácil evitar que a mão pesada da máquina federal cause um desequilíbrio neste ecossistema de cérebros. Nunca na história o pessoal do software livre se viu diante de uma encomenda tão grande de trabalho. Será que eles seguram o tranco?

A favor: Estima-se que, só em licenças para usar softwares fechados, o governo brasileiro gaste mais de U$ 1 bilhão de dólares por ano. Mais do que com Cultura e Fome Zero juntos. Com tantos problemas para resolver, o Brasil não precisa ajudar Gates a ficar mais rico do que ele já é.

fonte:Ministério da Cultura